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Epecuén, a cidade esquecida da Argentina

Na década de 1920, uma próspera aldeia se estabeleceu ao longo da costa do Lago Epecuén, um lago salgado situado a 600 quilômetros a sudoeste de Buenos Aires, Argentina. Reconhecendo seu potencial turístico, em 1921, um modesto complexo termal foi inaugurado.

A partir do ano seguinte, terrenos ao redor do lago foram postos à venda, impulsionando o crescimento da Villa Lago Epecuén. O local oferecia águas termais, piscina de água doce, campos de tênis, centro de recreação, tratamentos médicos, lojas e até mesmo uma usina de energia para atender às necessidades da população.

Epecuén, a cidade esquecida da Argentina

O Lago Epecuén é o maior dos cinco lagos da região, caracterizado por altos níveis de sal, apenas superados pelo Mar Morto e sendo dez vezes mais salgado do que qualquer oceano. Além disso, estudos indicam que suas águas possuem propriedades curativas, eficazes contra doenças como reumatismo, artrite, problemas de pele, fadiga física e mental, anemia e depressão, entre outras.

Mais do que um ponto turístico, o local foi um centro de estudos científicos e médicos desde 1886, reconhecendo as propriedades benéficas de suas águas, certificadas como fonte de saúde. A lenda local relata que Carhué, um chefe indígena cujo nome significa “coração puro”, superou uma misteriosa paralisia ao banhar-se nas águas da lagoa formada pelas lágrimas de dor de sua amada Epecuén, que significa “eterna primavera”.

Epecuén, a cidade esquecida da Argentina
Foto aérea tirada no dia 03 de maio de 2011 e se percebe que as águas começam a recuar

A vila passou de uma tranquila aldeia nas montanhas para um próspero resort turístico de renome internacional. Com a inauguração de uma linha férrea conectando-a a Buenos Aires, a cidade atraiu turistas de toda a América do Sul e do mundo. Na década de 1960, mais de 25.000 visitantes por ano desfrutavam das águas salgadas reconfortantes. Até 1980, a cidade contava com 5.000 quartos de hotel, 250 empresas, hotéis e mais de 100 hectares de áreas para camping, com uma população fixa de 1.500 pessoas.

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Nível de água instável

O lago Epecuén, apesar de sua grande extensão, revelou-se raso, com uma profundidade média de apenas um metro confirmada em 1959. Recebendo água de outros lagos, a evaporação constante resultava no acúmulo de sais minerais no fundo do lago. Sendo o último na cadeia de lagos e lagoas, localizado na parte inferior de uma depressão, seu nível de água era sempre variável. Quando baixo, a concentração de sal era elevada, formando uma crosta que impedia o banho.

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Entre 1914 e 1919, chuvas abundantes aumentaram o volume de água, tornando o lago propício para inauguração em 1921. No entanto, as constantes variações persistiram por 50 anos, até a conclusão de um projeto hidráulico em 1975, trazendo água de outras fontes e estabilizando o nível do lago Epecuén. Para garantir a contenção, um muro em forma de ferradura com 3,5 metros de altura foi construído ao redor do resort.

A exploração comercial da área continuou até 1980, e uma vez que o lago recebia vários pontos de captação de água, o processo de mineralização e salinidade começou a mudar. Infelizmente, neste esforço contínuo que os seres humanos têm de querer controlar a natureza, eles não perceberam o que estava para acontecer. A quantidade de água da estação chuvosa, mais a água adicionada por obra humana e um evento climático conhecido como El Nino, que fez chover mais que o habitual nas colinas próximas do lago e isso por vários anos, fez Lago Epecuén encher e a Vila Epecuén lenta mais firmemente, começar a afundar.

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Em 10 de novembro de 1985, uma ruptura no muro de contenção permitiu que um imenso volume de água invadisse Epecuén, submergindo a cidade sob quatro metros de água. A inundação, avançando a um centímetro por hora, transformou completamente a cidade em apenas 15 dias. Os moradores, em uma evacuação apressada, tiveram que abandonar suas casas, muitas vezes deixando para trás móveis e veículos.

Em 1993, a água continuou a engolir Epecuén, cobrindo-a com dez metros de profundidade. Deslocados para a cidade vizinha de Carhué, a 8 quilômetros, alguns reconstruíram suas vidas, estabelecendo novos hotéis e saunas para tratamentos de pele com base em barro e água salgada. Muitos residentes moveram ações judiciais contra o governo, argumentando que a catástrofe poderia ter sido evitada. A maioria recebeu 50% do valor de suas propriedades, enquanto os mais persistentes obtiveram reembolso integral pelas perdas causadas pela inundação.

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Quase 25 anos depois, em 2009, o clima mudou e as águas começaram a baixar e a Vila Epecuén começou a reaparecer, toda tingida de branco, sem vegetação ou árvores. Muitas famílias voltaram para visitar seus entes queridos enterrados no cemitério que ficou décadas embaixo d’água.

A aldeia não foi reconstruída, mas se transformou novamente em uma atração turística para aqueles dispostos a enfrentar as seis horas de viagem desde Buenos Aires por estreitos caminhos rurais que perfazem 550 km. Quem chega hoje a Epecuén pode ver os restos oxidados de carros e móveis, casas em ruínas e eletrodoméstico destruídos. Escadas levam a lugar algum, e os cemitérios, revirados, expõem tumbas outrora enterradas. É uma paisagem estranha e apocalíptica, que representa um momento traumático para a posteridade.

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O antigo matadouro de Villa Epecuen, fotografado em 4 de maio de 2011
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Comparativo do que era e como é atualmente, uma das avenidas principais da cidade. A foto mais antiga é da década de 1970

No Passado

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A enchente

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Muro de contenção sendo rompido pelas águas do Lago Epecuén em 10 de novembro de 1985
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Artigo publicado originalmente em agosto de 2015

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Movido por uma curiosidade insaciável, ansiava por um espaço onde pudesse preservar as curiosidades singulares que encontrava em livros e na internet. Dessa busca, surgiu o Magnus Mundi em 2015. Julio Cesar, nascido em Blumenau e residindo em Porto Belo, litoral de Santa Catarina, viu seu desejo de compartilhar maravilhas peculiares tomar forma nesse site.

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