Animais & Natureza Lugares

A saga dos caranguejos vermelhos

O caranguejo vermelho da Ilha Christmas, Gecarcoidea natalis, é uma espécie terrestre endêmica. Sua migração anual em massa durante a desova é um espetáculo notável e crucial.

Todo final de outubro, 120 milhões de caranguejos vermelhos (Gecarcoidea natalis) invadem a costa e as águas da Ilha Christmas, um pequeno paraíso no Oceano Índico, a 360 quilômetros ao sul da Indonésia. Possessão australiana de 135 km² – o equivalente a cinco ilhas de Fernando de Noronha – Christmas tem praias de águas mornas, bordadas de altas falésias de calcário, e uma imensa floresta tropical que cobre 3/4 do território. Até 1988, a ilha era inabitada.

A descoberta de importantes jazidas de fosfato motivou o aparecimento de um pequeno povoado, que hoje não passa dos 2 mil (2011) habitantes. O lugar é famoso pelos pássaros raros e pelas quinze espécies de caranguejos que vivem nas matas úmidas.

A saga dos caranguejos vermelhos

Durante onze meses predomina a calma na Ilha Christmas. Junto com a temporada de chuva, que começa em fins de outubro, começa também o sufoco dos moradores. Eles fecham cuidadosamente as portas e janelas e evitam pôr os pés fora de casa. É quando o exército vermelho inicia a migração das matas para os lugares de reprodução, nas praias, migração essa sendo descrita como um das maravilhas do mundo animal. No seu rastro não sobra nada. Predominantemente vegetarianos, eles devoram folhas mortas, frutos e flores.

Alguns mal-humorados são capazes de comer pássaros mortos ou até bitucas de cigarro ainda acesas. Até o momento não há registro de ataques a seres humanos. Por incrível que pareça, os caranguejos vermelhos – a espécie mais populosa da ilha – são a melhor garantia da manutenção do ecossistema de Christmas. É que seus excrementos fertilizam a terra.

A saga dos caranguejos vermelhos

A expedição dos caranguejos vermelhos até a praia dura vinte dias. Pelo menos um milhão deles morrem atropelados nas ruas ou queimados nos trilhos escaldantes de trem. Mas as baixas representam menos de 1% do total e não chegam a ameaçar a proliferação da espécie. À frente da procissão vão os machos mais velhos, seguidos das fêmeas e dos jovens. Depois de atravessar o povoado, é hora de descer falésias de até 200 metros para chegar à costa. Em poucas horas as praias ficam parecendo campos minados. Cada um dos milhões de buracos cavados pelos machos abriga um casal.

Depois de acasalar, os maridos voltam a floresta. As fêmeas ficam dentro dos nichos mais doze dias protegendo os ovos fecundados (cem mil cada) e seguem de volta às matas após depositar as larvas no mar. É quando a caranguejada (adultos mais as larvas) atinge a espetacular cifra de 120 milhões.

A saga dos caranguejos vermelhos

Os filhotinhos, nesta fase, parecem minúsculos camarões e fazem a felicidade dos peixes dos recifes. Em certos anos, vítimas dos predadores e de correntes marítimas contrárias, milhões de larvas não conseguem escapar. Somente depois de 25 dias no oceano as larvas transformam-se em pequeninos caranguejos. Eles surfam até a praia e instintivamente rumam para a floresta e desaparecem em afloramentos rochosos, galhos de árvores caídos e escombros no chão, para os próximos três anos.

Chegam ao destino os que escapam dos trens, dos carros e das garças, que se deliciam com a minúscula iguaria. De novo, não é o momento de deixar as janelas abertas. Estoicamente, os habitantes armam-se de vassouras e expulsam os invasores. Depois, tudo volta à ordem. O exército vermelho recolhe-se dentro da floresta para a temporada de inverno. As chuvas limpam completamente a sujeirada nas rotas dos bichos escarlates e a vida segue em frente.

Para proteger os caranguejos de serem esmagados por veículos, a equipe do Parque Nacional de Ilha Christmas fecham algumas estradas temporariamente, principalmente no auge da migração. São colocadas pequenas muretas e cercas de plástico ao longo das estradas para forçar os caranguejos seguirem aos “cruzamentos e pontes” construídos para esse fim, afim de poderem atravessar com segurança. A migração de caranguejo e as pontes de caranguejo se tornaram uma grande atração turística.

A saga dos caranguejos vermelhos

Os caranguejos vermelhos estão sendo ameaçados por uma espécie de formigas invasoras que se tornaram abundantes na ilha. No início do século 20, as formigas loucas amarelas (Gracilipes anoplolepis) conseguiram chegar às Ilhas Christmas e formaram super colônias, com bilhões de formigas.  As formigas loucas expelem um spray de ácido fórmico nos olhos e articulações das pernas dos caranguejos, que os imobiliza, fazendo-os morrerem e se tornarem alimentos para elas.

Em alguns casos, os caranguejos que vivem em áreas livres das formigas loucas são mortos durante sua migração anual e assim nunca mais retornam à sua floresta de origem e isso cria zonas livres de caranguejos, mesmo aonde as formigas não percorrem. Com menos caranguejos, a floresta se tornou menos diversificada, com um solo denso e compactado devido ao colapso das tocas de caranguejos. Outras espécies invasoras como o caramujo africano gigante tornaram-se comuns onde os caranguejos diminuíram.

A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos
A saga dos caranguejos vermelhos

Artigo publicado originalmente em dezembro de 2016

Fonte: 1

Avalie este artigo!
[Total: 0 Média: 0]
Atenção! Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do usuário e não expressa a opinião do site.

Magnus Mundi

Movido por uma curiosidade insaciável, ansiava por um espaço onde pudesse preservar as curiosidades singulares que encontrava em livros e na internet. Dessa busca, surgiu o Magnus Mundi em 2015. Julio Cesar, nascido em Blumenau e residindo em Porto Belo, litoral de Santa Catarina, viu seu desejo de compartilhar maravilhas peculiares tomar forma nesse site.

4 comentários

Clique para deixar um comentário