Animais & Natureza

Tarântulas como alimento no Camboja

No fundo da selva de uma província do Camboja, Svay Leur Riet, um morador local, sai todos os dias para caçar tarântulas, que ele vende para um restaurante próximo de sua residência, localizado na cidade de Siem Reap, perto do famoso templo Angkor Wat. Para ele e sua família, cada tarântula rende 500 riels (cerca de 41 centavos cada), dinheiro esse que os sustenta. Durante séculos os cambojanos caçaram essas grandes aranhas, usando-as para fins medicinais e também como alimentos.

Tarântulas como alimento no Camboja

No entanto, a aranha só veio a ser um prato popular em meados da década de 1970, quando a escassez de alimentos durante o regime dos Khmer Vermelho obrigou às pessoas a comerem de tudo que encontrassem. Atualmente, as aranhas são consideradas uma iguaria e são vendidas em mercados e restaurantes por todo o país. As tarântulas são ricas não só em proteínas, mas também contêm ácido fólico e zinco, e os cambojanos acreditam que possuem propriedades medicinais.

Para pegar uma aranha entocada na terra, os caçadores embebedam um pano colocado na ponta de uma vara com gasolina e os colocam na entrada da toca do animal. O cheiro da gasolina fará o artrópode rastejar para fora, tornando mais fácil sua captura. Apesar do tamanho e aspecto sinistro, as tarântulas não são perigosas para a espécie humana, uma vez que não produzem toxinas nocivas aos humanos, por isso são eventualmente criadas como animais de estimação. Uma de suas defesas são os pelos urticantes de suas costas e abdômen, que irritam a pele do possível predador.

Tarântulas como alimento no Camboja
Tarântulas da espécie Haplopelma albostriatum

Porém a mordida da aranha é dolorosa e a caça pode ser bastante perigosa, uma vez que os caçadores confundem as tocas, encontrando escorpiões e cobras dentro delas. Mas em um país onde mais de 20% da população vive com apenas um dólar por dia, o risco para muitas pessoas é justificado. Um bom caçador pode pegar cerca de 100 aranhas por dia, que é quase 41 reais em receita.

Muitas pessoas pegam aranhas para ganhar dinheiro, mas para mim também é um hobby”, diz Riet. – “Adoro comer aranhas. É como pescar para quem gosta de peixe. Nós apreciamos a longa caçada na floresta e, à noite, podemos sentar confortavelmente, comendo nossa “captura” na companhia de amigos acompanhado de um copo de cerveja fresca.” Comentou Svay Leur Riet.

Embora as tarântulas possam ser fritas em uma grelha e servidas com arroz e vegetais, a forma mais popular de preparar uma aranha é temperá-la com molho de soja, alho, sal e até açúcar, e depois de frita ficam até crocante. Os cambojanos dizem que o abdômen, onde está a maior quantidade de carne, é a melhor parte da aranha, embora as pernas e a cauda também sejam comidas, e a carne se parece muito com a do frango. Os mais entendidos apreciam as fêmeas, uma vez que seus ovos têm um gosto e um sabor especial.

Tarântulas como alimento no Camboja

No Camboja, acredita-se que as tarântulas curam a dor nos joelhos, costas e problemas respiratórios, além de melhorar a ereção e aumentar a energia. Também se acredita que elas podem tornar as mulheres mais bonitas. Normalmente, os curandeiros colocam os animais em vinho de arroz por um mês antes de vender a mistura, como remédio. No entanto, talvez a utilização mais estranha das aranhas é que são mantidos como animais de estimação para os filhos dos caçadores, onde por segurança, suas mandíbulas são cortadas.

Tarântulas como alimento no Camboja

As tarântulas ou caranguejeiras, fazem parte da família de aranha Theraphosidae, que se caracterizam por terem pernas longas com duas garras na ponta, e corpo revestido de cerdas. As tarântulas habitam as regiões temperadas e tropicais das Américas, Ásia, África e Oriente Médio. Enquanto crescem, têm uma fase de troca de pele chamada ecdise. Em média atingem de 15 a 25 centímetros de comprimento com as pernas estendidas, mas existem espécies que podem chegar até 30 centímetros, como é o caso da tarântula-gigante-comedora-de-pássaros (Theraphosa blondi) da América do Sul.

Tarântulas como alimento no Camboja

As tarântulas são animais solitários e notívagos. Alimentam-se de pequenos animais, que nas espécies maiores podem incluir pequenos pássaros, roedores ou anfíbios. Todas as espécies de tarântulas apresentam canibalismo. A maioria das Tarântulas não se afasta de sua toca, nem mesmo para se alimentar, pois sentem a presença das presas pela vibração do solo.

O macho normalmente é quem faz as viagens mais longas para encontrar as fêmeas. As tocas são normalmente subterrâneas, geralmente aproveitadas de outras aranhas ou roedores. São forradas com sua teia formando uma seda, o que arrefece o esconderijo. Geralmente ficam próximas a raízes de árvores e pedras, e podem chegar até um metro de profundidade. Existem espécies que também são arbóreas — não necessitam ir ao solo durante toda sua vida, e fazem tocas em buracos nas árvores.

Tarântulas como alimento no Camboja
Svay Leur Riet, caçador de tarântulas

A aranha originalmente chamada de “tarântula” foi a espécie Lycosa tarantula, uma aranha lobo da família Lycosidae nativa da Europa mediterrânica. O nome deriva da cidade portuária do sul da Itália, Tarento, região onde estas aranhas são facilmente encontradas e que, posteriormente, foi aplicado a quase todas as espécies de aranhas de grande porte, especialmente a família das Mygalomorphae, das regiões mais quentes da América e as theraphosidae.

Durante muito tempo acreditou-se, no sul da Europa, que uma pessoa picada pela tarântula seria tomada de extrema melancolia e poderia mesmo morrer se não se entregasse a uma dança frenética, a tarantela, capaz de eliminar o veneno pela transpiração. Tanto o nome do agente causador do suposto distúrbio quanto o da dança derivam do topônimo da cidade italiana. O termo vem do latim tarento, de origem grega Taras (do genitivo tarantos, que significa “carvalho“), personagem da mitologia grega fundador da colônia grega de Taras (Tarentum, a moderna cidade de Taranto).

Tarântulas como alimento no Camboja

O governo cambojano concebeu uma oferta verdadeiramente peculiar para os turistas: uma oportunidade ímpar que convidava os viajantes ocidentais a se aventurarem na captura e até mesmo no consumo de suas próprias tarântulas. Tal iniciativa visava proporcionar uma experiência incomum e memorável, inserindo os turistas diretamente na trama da cultura local. Embora improvável que agências de viagens tenham incorporado tal “excursão” aos seus pacotes, a disposição local para tal empreitada não escasseia, com entusiastas prontos para guiar os estrangeiros nesse novo e intrigante negócio de caça.

Essa forma de “diversão” rapidamente se tornou uma sensação nas cidades de Skun e na província de Kampot Cham, consolidando-se como uma atração que transcende as fronteiras do tradicional e se insere no panorama turístico de maneira inusitada. Entre os habitantes locais, uma disposição inabalável é evidente, pronta para compartilhar suas habilidades e conhecimentos com os visitantes que desejam mergulhar nessa vivência única, que vai muito além do convencional. Assim, esse curioso capítulo na história do turismo cambojano se destaca como um exemplo peculiar de como culturas distintas podem se entrelaçar de maneira surpreendente e cativante.

Tarântulas como alimento no Camboja

Tudo que é incomum acaba atraindo uma multidão de pessoas, e a caça as aranhas não seria diferente. Os inúmeros relatos dos visitantes nas redes sociais comprovam o sucesso da empreitada, de pessoas contando como conseguiram capturar com as próprias mãos uma aranha perigosa, cozinha-la no molho de soja ou fritar com sal e alho e depois comê-la. Na verdade, pegar uma tarântula, não tem nada complicado. Basta saber que estas aranhas são encontradas na selva e nas plantações de caju. Porque a tarântula é um animal noturno, e assim são caçadas à luz do dia em suas tocas, facilmente.

Tarântulas como alimento no Camboja

O comércio ativo de tarântulas ocorre diariamente nas lojas espalhadas na cidade cambojana de Skun, especialmente numa feira próximo a rodoviária. Vem turistas de todo o Camboja, do Vietnã, Coreia, França, Inglaterra e outros países atrás do animal. De acordo com o vendedor Cham Tari, que trabalha no mercado há mais de dez anos, a demanda por iguarias exóticas é muito alta. “Os vietnamitas gostam de comprar aranhas vivas, e eles levam 20 a 40 delas de uma vez. Os chineses, às vezes fazem pedidos de 5.000 tarântulas. Então, coletamos as aranhas, as alimentamos até a entrega do pedido. É apenas mais um negócio“, disse Tari.

Tarântulas como alimento no Camboja

Na maioria das vezes, no Camboja, são vendidas as tarântulas da espécie Haplopelma albostriatum, também conhecida como a tarântula zebra tailandesa. O tamanho delas é a de uma palma de mão e elas podem ser bem agressivas, quando irritadas. O seu veneno é considerado mais forte do que o veneno de outras espécies, embora também não seja fatal para os seres humanos.

Por causa do aumento no comércio de tarântulas na vizinhança da cidade de Skun, a cada ano está se tornando mais difícil de consegui-las na quantidade procurada, dizem os vendedores. Os ecologistas temem que a caça excessiva e a mudança de habitats naturais levem ao seu completo desaparecimento no Camboja.

Tarântulas como alimento no Camboja
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Movido por uma curiosidade insaciável, ansiava por um espaço onde pudesse preservar as curiosidades singulares que encontrava em livros e na internet. Dessa busca, surgiu o Magnus Mundi em 2015. Julio Cesar, nascido em Blumenau e residindo em Porto Belo, litoral de Santa Catarina, viu seu desejo de compartilhar maravilhas peculiares tomar forma nesse site.

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