Em 1633, o sultão otomano Murad IV chocou Istambul, na Turquia ao proibir o consumo público de café, impondo pena de morte aos transgressores. Acreditava-se que as cafeterias eram responsáveis pela decadência social e desunião da capital otomana. Murad IV, conhecido por sua brutalidade, patrulhava as ruas disfarçado, decapitando pessoas que ousavam desafiar a proibição. Essa proibição não era única, mas destacou-se como uma das mais severas na história do café.
A infância traumática de Murad IV, testemunhando o brutal assassinato de seu irmão pelos janízaros, influenciou suas políticas draconianas. Temendo rebeliões, ele via nas cafeterias um ponto de encontro perigoso para conspirações. Impôs a pena de morte não apenas ao café, mas também ao tabaco e ópio, buscando manter o controle sobre os janízaros e prevenir a desordem.
A repressão ao consumo de café teve início no século XVI, coincidindo com a disseminação global da bebida. Embora os grãos de café fossem conhecidos na Etiópia por séculos, a primeira evidência histórica clara do preparo e consumo de café remonta ao século XV no Iêmen, conforme estabelecido pelo historiador Ralph Hattox em seu livro ‘Coffee and Coffeehouses‘.
Nesse período, ordens muçulmanas sufis locais utilizavam a bebida em cerimônias místicas, seja como um ato social para promover a fraternidade, um narcótico para induzir intoxicação espiritual ou um estimulante pragmático da concentração. A popularidade do café se espalhou pelo Mar Vermelho, chegando a Istambul no início do século XVI e à Europa cristã no século seguinte.
Murad IV também legalizou a venda e consumo de álcool mesmo para muçulmanos, ato que não tinha precedentes na época. Anteriormente conhecido por gostar de beber, em 1634 percebeu os perigos do vinho, proibiu a venda e o consumo de álcool e ordenou o encerramento das tabernas. Ele ordenou a execução por quebrar esta proibição e restaurou os regulamentos judiciais por meio de punições muito rigorosas, incluindo a execução; Certa vez, ele estrangulou um grão-vizir porque o oficial havia espancado sua sogra.
Apesar das proibições, a cultura do café se espalhou pelo mundo a partir do século 16, desafiando não apenas as restrições otomanas, mas também as resistências europeias. Muçulmanos conservadores e líderes religiosos europeus usaram argumentos religiosos para proibir o café, considerando-o ilegal e prejudicial ao corpo humano.
O café como espaço social
Antes dos cafés, o Império Otomano carecia de espaços sociais acessíveis. Mesquitas eram impraticáveis para longas conversas, enquanto tabernas não eram apropriadas para bons muçulmanos. Cafeterias se tornaram locais democráticos, acessíveis a todos, onde as pessoas podiam discutir livremente, incluindo assuntos políticos. A repressão inicial visava manter o controle, mas, gradualmente, a corte otomana reconheceu a legitimidade do café.
No final do século 18, as proibições ao café cessaram, e os cafés se tornaram locais de encontro mais seculares. A cultura do café venceu as resistências religiosas e políticas. Governantes, embora ainda colocassem espiões para monitorar conversas anti-regime, não conseguiam mais reprimir a ascensão da cultura do café.
Da proibição à globalização do café
Hoje, vivemos em um mundo onde a cultura do café triunfou sobre o conservadorismo religioso e político. Marcas como Starbucks e Hard Rock Café são testemunhas da globalização e aceitação generalizada do café. A história de Istambul nos lembra da jornada incrível que essa bebida passou, de ser proibida sob pena de morte a se tornar uma parte essencial da vida cotidiana em todo o mundo.
Adicionar comentário