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The Rock, a prisão de Alcatraz

Quem não adoraria ir para uma ilha à prova de intrusos, repleta de histórias e no meio de uma das mais famosas baías do mundo? Quem não trocaria a vida insegura das grandes metrópoles por uma ilha superprotegida, a menos de quinze minutos de barco da mais bela cidade dos Estados Unidos, e de onde se tem uma das melhores vistas do maior cartão-postal da região, a imponente ponte Golden Gate? Quem, afinal, não gostaria de ir para uma ilha assim? Bem, milhões de pessoas vão para lá todos os anos, e todas, inclusive, pagaram por isso. Mas houve uma época em que os homens nem podiam ouvir falar daquele lugar – alguns, inclusive, deram a própria vida para tentar sair dali. Não, a humanidade não mudou tanto assim, O que mudou foi aquele lugar: de pior penitenciária da América, a histórica Alcatraz transformou-se, hoje, na mais famosa atração do Parque Nacional de Golden Gate, em São Francisco, nos EUA, depois, é lógico, da própria ponte que lhe deu o nome.

Obviamente que isso só aconteceu por causa da própria fama do presídio – jamais pelos atributos naturais de Alcatraz que, no fundo, não passa de um grande rochedo, frio, molhado e inóspito, fincado nas águas traiçoeiras da Baía de São Francisco, a menos de dois quilômetros em linha reta do porto da cidade. Parece perto demais – e é. Só que entre as pedras pontiagudas de Alcatraz (os presos a chamavam, com ódio, apenas de “The Rock“) e a agitação das ruas de São Francisco passa uma das mais frias e intensas correntezas da Costa Oeste americana. Além disso, aquelas águas vivem infestadas de tubarões. Foram estas particularidades – muito mais do que as grossas barras de ferros das celas – que fizeram de Alcatraz a mais inexpugnável das prisões do mundo, durante os 29 anos em que ficou em atividade, de 1934 a 1963.

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No total, cerca de 2 mil presos (todos de altíssima periculosidade) passaram por ali – ao que consta, nenhum conseguiu fugir. Dos 36 que tentaram, oito foram mortos, 23 prontamente recuperados e cinco dados como desaparecidos na fria correnteza da baía – entre eles o trio Frank Lee Morris mais os irmãos Clarence e John Anglin, que na noite de junho de 1962 protagonizaram a mais espetacular das fugas da ilha. Depois de descobrirem que o cimento das paredes das suas celas estava carcomido pela maresia, os três moldaram máscaras em papel higiênico e sabão de seus rostos (o cabelo, por exemplo, veio dos restos da barbearia), puseram-nas camas e, livres dos guardas, passaram a usar as noites para escavar um túnel, a partir dos respiradouros das celas. Em pouco tempo, estavam do lado de fora da fortaleza. Mas, depois que, mergulharam no mar, nunca mais foram vistos.

A ousadia do grupo mostrou a precariedade da manutenção da ilha. Dia e noite açoitada por ventos gelados e úmidos, Alcatraz literalmente começou a ruir, até que foi definitivamente fechada, em 21 de março de 1963. Ainda hoje, porém, os turistas que chegam à ilha, num ritmo de oito barcos por dia, podem sentir na pele o clima cruel do maior cárcere da história: celas minúsculas como um porão (tinham uma cama, uma privada e nada mais) e congelantes feito um freezer (por causa do piso em aço). Além disso, ficam sabendo através de dedicados guias tudo sobre o dia-a-dia da extinta prisão: despertar às 6h30 da manhã, trabalhos forçados o dia inteiro, portas controladas eletronicamente, treze contagens diárias, um guarda para cada três presos, nenhuma mulher, cinco suicídios, oito assassinatos, severas punições para qualquer tipo de infração e visitas mensais de, no máximo, 45 minutos – e por telefone!

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Em compensação, entre outras regalias, os presos tinham biblioteca, barbearia, hospital, passeios diários no pátio e um cardápio digno de restaurante: ovos mexidos, cereais, leite, café, torradas e frutas, por exemplo, num único café da manhã. Tudo isso como forma de acalmar os ânimos e evitar tensões que resultassem em rebeliões. Afinal, a despeito de tudo, o que aqueles homens queriam mesmo era fugir daquele lugar. O mesmo para onde hoje todo mundo que ir.

Em 1775 o navegador Juan de Ayala descobriu a ilha e a batizou de La Isla los Alcatraces (Ilha dos Pelicanos, em português). O United States Census Bureau nunca registrou o número de habitantes da ilha, mesmo quando esta servira de prisão e base militar e no Censo de 2000 a ilha permanecia desabitada. Em 1850, o 13º presidente dos EUA transformou a ilha em base militar como consequência da Guerra Mexicano-Americana e permaneceu assim até 1930, para então ser convertida numa prisão de segurança máxima. Em 1969, um grupo de nativos norte americanos criou um movimento que ocupou a ilha, baseando-se num tratado federal de 1868, que permitia que os nativos utilizassem todo o território que o governo não usava ativamente. Após quase dois anos de ocupação, o governo os retirou da ilha. Em 1979 foi feito um filme sobre a fuga de Frank Morris e os irmãos Anglin com o ator Clint Eastwood chamado “Escape from Alcatraz“. A história chegou a ser testada no programa “Mythbusters – Os Caçadores de Mitos” no episódio Fuga de Alcatraz.

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Hóspedes nada ilustres

AL CAPONE – O “Scarface”, mais famoso gângster do mundo, foi para a ilha em 1934, sob uma banal acusação de sonegação de impostos. Ficou cinco anos ali, sendo dois numa cela isolada do hospital da penitenciária. Morreu na Flórida, em 1947, aos 48 anos.

ROBERT STROUND – Muitíssimo mais conhecido como o “Homem-Pássaro de Alcatraz”, tornou-se um especialista autodidata em passarinhos (escreveu até livros sobre o assunto), ao longo dos dezessete anos que passou trancado numa das solitárias da ilha por assassinato. Morreu aos 72 anos, sem nunca ter recebido autorização para criar uma única ave naquela prisão.

GEORGE KELLY – Sob o apelido de “Machine Gun” (“Metralhadora”, por causa da arma que usava), fez fama como o pior assaltante de bancos da América na década de 20. Finalmente preso, chegou em Alcatraz em 1934 e só saiu de lá dezessete anos depois, igualmente famoso. “Era tão inteligente e articulado que mais parecia um banqueiro do que um bandido”, comentavam os guardas da prisão.

ALVIN KARPIS – O “Creepy” (“Horripilante”, em inglês) foi durante muito tempo o inimigo público número 1 dos EUA. Capturado pelo FBI em 1936, passou 27 anos e nove meses na ilha, de onde só saiu para morrer – já velho, doente e em liberdade condicional – em sua terra natal, no Canadá.

*FRANK LEE MORRIS – Junto com os irmãos Clarence e John Anglin, ficou mundialmente conhecido por sua espetacular fuga, em 1962, que acelerou o fechamento da prisão. Depois de enganarem os guardas com máscaras papel mâché e sabão, eles escalaram o prédio e saltaram para o mar, de onde nunca mais saíram. Dados como mortos, acabaram virando lenda e filme.

Os presos fizeram cabeças de papier-mâché e sabão e as colocaram nas camas para enganar os guardas | Foto: FBI
Os presos fizeram cabeças de papier-mâché e sabão e as colocaram nas camas para enganar os guardas | Foto: FBI
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Para encobrir o buraco por onde eles escaparam, improvisaram um tampão feito em papel mâché
Visto do buraco fora das celas por onde os três fugitivos mais famosos escaparam
Visto do buraco fora das celas por onde os três fugitivos mais famosos escaparam

*Em 2015, foi divulgado pela mídia de que Frank Morris e os irmãos Anglin podem estar vivos e morando no Brasil. Um documentário do canal History, “Alcatraz: Search for the Truth” (Alcatraz: busca pela verdade), com evidências e depoimentos de familiares dos presos, alegam que a história pode ter sido diferente. Segundo a família, a mãe de John e Clarence recebeu por três anos, após a fuga da prisão, cartões de Natal assinados pelos filhos. A caligrafia foi analisada e acredita-se que seja deles, apesar de a data dos cartões não ter sido comprovada. A família também afirma que um exame de DNA revelou que os restos mortais achados na ilha não pertenciam a eles.

Fotos do Departamento de Justiça dos EUA mostram os detentos Frank Morris, Clarence Anglin e John Anglin na época em que fugiram e, abaixo, a reconstituição de como eles estariam hoje (Foto: Divulgação/Departamento de Justiça dos EUA)
Fotos do Departamento de Justiça dos EUA mostram os detentos Frank Morris, Clarence Anglin e John Anglin na época em que fugiram e, abaixo, a reconstituição de como eles estariam hoje (Foto: Divulgação/Departamento de Justiça dos EUA)
Imagem mostrada em documentário que poderia, segundo a famiília, ser dos irmãos Clarence e John Anglin no Brasil, em 1975 (Foto: Divulgação/History Channel/Arquivos da família Anglin)
Imagem mostrada em documentário que poderia, segundo a família, ser dos irmãos Clarence e John Anglin numa fazendo no Rio de Janeiro, em 1975 (Foto: Divulgação/History Channel/Arquivos da família Anglin)

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Fontes: 1 2 3

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Movido por uma curiosidade insaciável, ansiava por um espaço onde pudesse preservar as curiosidades singulares que encontrava em livros e na internet. Dessa busca, surgiu o Magnus Mundi em 2015. Julio Cesar, nascido em Blumenau e residindo em Porto Belo, litoral de Santa Catarina, viu seu desejo de compartilhar maravilhas peculiares tomar forma nesse site.

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