Animais & Natureza

As cabras escaladoras do Marrocos

O sudoeste do Marrocos provavelmente é um dos poucos lugares do mundo onde você será realmente perdoado por fazer perguntas idiotas como “Será que cabras crescem em árvores?”. Para todos os lugares em que a vista pode alcançar, você vai encontrar um monte de cabras dependuradas nas copas das árvores, mastigando distraidamente suas folhas e frutos.

As cabras são escaladoras naturais e bem conhecidas por escalar paredes rochosas íngremes e montanhas em busca de líquens e musgos. Já as cabras do Marrocos preferem subir em árvores pela mesma razão: comida, que é escassa nessa região seca. As cabras são atraídas pelo fruto da Argânia (Argania spinosa), muito parecida com a oliveira, a árvore da azeitona. A Argânia mede entre 8 e 10 metros de altura e vivem até 200 anos e elas são cheias de espinhos, com troncos retorcidos, mas os cabritos, que escalam essas árvores por séculos, aprenderam a adaptar-se à tarefa.

As cabras escaladoras do Marrocos

As cabras nativas desta região têm pés fendidos. Cada casco tem dois dedos do pé que proporcionam equilíbrio e alavancagem, enquanto as solas dos pés são suaves e flexíveis, ajudando-as na aderência nas árvores. Os animais também têm dois dedos vestigiais mais elevados nas suas pernas, chamados presunhos (dewclaws”). Estes são encontrados em muitas espécies, incluindo cães e gatos, mas os presunhos das cabras são muito mais firmes e atarracados e ajudam-nas a se fixar nos galhos ou penhascos.

A Argânia é endêmica de áreas semidesérticas do vale de Souss, no sudoeste do Marrocos e também na região argelina de Tindouf, no Mediterrâneo ocidental. O fruto também é uma valiosa fonte de óleo, e uma importante fonte de economia para os berberes do Marrocos. O argan (ou argão), que tem cerca de 2 a 4 cm de comprimento, tem uma noz muito dura coberta por uma polpa carnuda que as cabras comem.

Dentro da noz há uma ou duas pequenas sementes ricas em óleo. O fruto leva mais de um ano para amadurecer, entre junho a julho. Até que isso aconteça, as cabras são mantidas longe dos bosques de Argânia, porque os animais muitas vezes comem a fruta antes que esteja madura, bem como as folhas causando o nanismo no crescimento das árvores.

As cabras escaladoras do Marrocos

Tradicionalmente, as cabras eram uma parte importante no negócio da produção de óleo. O povo local conhecidos com “berberes” precisavam que as cabras comessem o fruto, porque a dura noz passa ilesa pelo sistema digestivo do animal. A excreção da cabra era então recolhida, e as sementes moídas ou removidas e pressionadas para extrair o óleo, que é utilizado em molhos de saladas e cosméticos. A remoção da polpa macia, realizada pelas cabras, era a parte mais trabalhosa do processo de extração do óleo. Os métodos modernos, no entanto, ultrapassaram esta fase, porque um cheiro “cabreiro” às vezes pode ser detectado no óleo.

Em Marrocos, as florestas de Argânia cobrem atualmente cerca de 8.280 km² e foram designadas como parte da Reserva da Biosfera pela UNESCO. Mas essa área foi reduzida a aproximadamente a metade nos últimos 100 anos, devido à produção de carvão, aumento das áreas de pastagem e à agricultura cada vez mais intensiva. Apesar de haver uma esperança de conservação dessas árvores em razão do recente florescimento do mercado de exportação do valorizado óleo de argan, a riqueza trazida pelo óleo criou outra ameaça para as árvores: o aumento da população de cabras. Os camponeses locais têm usado o dinheiro obtido com a venda do óleo de argan para adquirir mais cabras; estas prejudicam o crescimento das árvores pois se alimentam das suas folhas e frutos.

As cabras escaladoras do Marrocos

Durante as últimas duas décadas, o óleo de argan subiu em popularidade e preço se tornando um dos mais caros do mundo (custa cerca de 900 reais o litro). Hoje é vendido na Europa e nos Estados Unidos, onde se tornou um produto de elite. Há gerações a sobrevivência dos berberes está diretamente ligada ao cultivo das Argânias, sendo que essas árvores servem como barreira à desertificação.

Entre as árvores, os berberes cultivam trigo, pastoreiam cabras e recolhem os frutos que caem durante o verão. No entanto, as virtudes desses frutos, recentemente descobertas por grandes empresas de cosméticos, provocaram uma exploração descontrolada, que ameaça a floresta e a vida dos camponeses da região. A agricultura familiar, a Argania e a criação de animais constituem os três recursos tradicionais dos camponeses berberes do Souss.

As cabras escaladoras do Marrocos

As cabras escaladoras do Marrocos

As cabras escaladoras do Marrocos

As cabras escaladoras do Marrocos

As cabras escaladoras do Marrocos
Argan, o fruto da Argania
As cabras escaladoras do Marrocos
Moagem da semente da Argan, para a extração do óleo
As cabras escaladoras do Marrocos
Mulheres selecionando as sementes da Argan

Publicado originalmente maio de 2015

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Movido por uma curiosidade insaciável, ansiava por um espaço onde pudesse preservar as curiosidades singulares que encontrava em livros e na internet. Dessa busca, surgiu o Magnus Mundi em 2015. Julio Cesar, nascido em Blumenau e residindo em Porto Belo, litoral de Santa Catarina, viu seu desejo de compartilhar maravilhas peculiares tomar forma nesse site.

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