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Bedlam: O hospital psiquiátrico que se tornou uma casa de terror

Bethlem Royal Hospital, fundado em 1247 em Londres, evoluiu de um convento religioso para um hospital psiquiátrico notório. Histórico marcado por tratamentos cruéis, mas reformulado para focar na reabilitação mental.

Os hospitais, embora fundamentais, geralmente não são destinos atraentes. Poucas pessoas encaram com agrado a necessidade de visitar um hospital, e muito menos ser internado nele. Quando o assunto são centros de detenção psiquiátrica, surgem os receios mais profundos, provenientes dos temores inerentes à mente humana.

A história nos apresenta instituições psiquiátricas de arrepiar, como o Asilo Willard para Insanos Crônicos nos Estados Unidos ou o Hospital Psiquiátrico Trenton em Nova Jersey, Estados Unidos. Contudo, entre essas narrativas assustadoras, destaca-se o Bedlam, o Hospital Psiquiátrico de Londres, pioneiro no confinamento de pacientes com doenças mentais, tratando-os de maneira que remete aos piores enredos de terror.

Cena do Bethlem Royal Hospital William Hogarth

Bedlam, o Hospital Psiquiátrico que hoje evoca terror, nem sempre foi percebido sob essa perspectiva sombria. O imponente edifício que o abrigava era tão majestoso que alguns chegaram a compará-lo ao Palácio de Versalhes. Sua designação oficial era Bethlem Royal Hospital ou St. Mary Bethlem, e durante muito tempo foi considerado um verdadeiro palácio para aqueles afligidos por distúrbios mentais.

Assim como muitos hospitais na antiguidade, teve suas origens em uma ordem religiosa, um convento dedicado a Santa Maria de Belém, fundado no século XIII, mais precisamente em 1247, sendo considerado o hospital psiquiátrico mais antigo do mundo ainda em funcionamento.

No ano de 1330, o Bethlem Royal Hospital já havia evoluído para um hospital medieval. Com o passar do tempo, sua missão transformou-se, passando a acolher todos os moradores de rua desamparados, sem um lar para recorrer. No entanto, foi em 1377 que essas paredes assumiram uma nova identidade como Bedlam, o Hospital Psiquiátrico onde centenas de indivíduos experimentaram horrores indescritíveis. Esta instituição singular na Europa tornou-se o refúgio para aqueles rejeitados pela sociedade, os que foram sentenciados a viver à margem de tudo.

Dentro dos muros do Bedlam, não apenas os doentes mentais, mas também criminosos de diversas naturezas compartilhavam o mesmo espaço. Indivíduos com deficiências mentais e esquizofrenia coexistiam com aqueles diagnosticados com mania crônica ou melancolia aguda. Bedlam não era apenas um Hospital Psiquiátrico; era também o destino para criminosos que haviam cometido as mais terríveis atrocidades, incluindo assassinos e infanticidas. O hospital adquiriu uma aura tão sombria e desastrosa que, em vez de ser reconhecido pelo seu nome oficial, Bethlem, tornou-se popularmente conhecido como Bedlam, uma expressão inglesa que denota “caos e confusão”.

Até o século XX, o Bedlam, este local aterrorizante, não servia como um espaço para auxiliar na recuperação da saúde mental de pacientes com problemas e perturbações mentais. Pelo contrário, era um ambiente marcado por tratamentos cruéis e impiedosos, sujeitando os indivíduos aos piores maus-tratos e humilhações. Ser internado no Bedlam não garantia ajuda; em vez disso, implicava isolamento social e sujeição a experimentos desumanos.

Melancolia e Loucura Raving (mania) esculpida por Caius Gabriel Cibber (1680)

O Hospital Psiquiátrico Bedlam conquistou sua reputação como um centro de terror, uma triste realidade que persistiu ao longo dos séculos. O pessoal do hospital especializou-se em práticas terríveis e cruéis, que sem dúvida infligiam profunda dor e delírio aos pacientes. Entre elas, destacava-se a chocante terapia de rotação lateral contínua, na qual o paciente era colocado em uma cadeira suspensa no teto, girando até 100 rotações por minuto para induzir o vômito. A justificativa era simplesmente a crença de que o vômito auxiliava na expulsão de males do corpo.

Fotos tiradas no Bethlem Royal Hospital em Londres – também conhecido como ‘Bedlam’ – entre 1856 e 1857 deveriam ajudar os médicos a analisar as condições de saúde mental através da expressão facial do paciente.

Inicialmente, a terapia eletroconvulsiva (ECT) e a lobotomia foram introduzidas como métodos pioneiros na busca por “ajudar” os pacientes a “recuperar” sua funcionalidade. No entanto, essas abordagens levaram a consequências desastrosas, resultando na perda de vidas e em danos cerebrais irreversíveis. Na maioria dos casos, isso decorreu da falta de conhecimento dos médicos ao aplicar esses procedimentos em pacientes clinicamente estáveis. Este equívoco agravou ainda mais a situação.

A tragédia dos confinados no Bedlam não se limitava às práticas terapêuticas. O hospital, carente de financiamento adequado e dependente do suporte financeiro das famílias dos pacientes e de doadores privados, transformou-se, no século XVIII, em uma espécie de circo macabro.

Abrindo suas portas para visitantes de todo o Reino Unido, o Bedlam permitia que as pessoas passeassem pelos corredores e, em alguns casos, até mesmo organizassem festas dentro de seus muros. Pacientes que não haviam perdido completamente a sanidade eram forçados a representar papéis de loucura, tornando-se a atração para garantir financiamento tão necessário. Um espetáculo onde a fragilidade da mente humana tornava-se a principal vítima. Em 1814 ocorreram 96 000 visitas deste gênero.

Mudança de direção

A escuridão que pairava sobre o Hospital Psiquiátrico Bedlam não perdurou indefinidamente. Na metade do século XIX, um homem chamado William Hood assumiu o cargo de médico residente em Bedlam, decidindo transformar completamente a instituição. Seu objetivo era criar programas de reabilitação genuínos, priorizando o atendimento aos pacientes em detrimento dos interesses administrativos, e ele obteve sucesso nessa empreitada. Seu trabalho foi tão impactante que o hospital foi realocado e continua em operação até hoje, desempenhando seu papel vital no auxílio a pessoas com transtornos mentais.

No entanto, a história permanece viva como um testemunho dos horrores que a humanidade pode infligir. Em um imenso palácio que mais se assemelhava a uma propriedade real do que a um asilo, centenas de seres humanos foram submetidos a torturas cruéis e martírios.

Bethlem Royal Hospital de Londres na atualidade

Por trás da fachada pomposa, que em diversas ocasiões parecia prestes a desmoronar, o espírito do horror ainda persistia. Bedlam conseguiu transcender seu passado sombrio ao derrubar suas antigas paredes. Hoje, em uma instalação moderna, o hospital faz parte da Maudsley NHS and South London Foundation. Tornou-se uma das principais instituições no mundo da psiquiatria, com a documentação mais extensa relacionada à saúde mental no Reino Unido e uma notável liderança global em pesquisa.

Para os entusiastas da história que apreciam desvendar os mistérios do passado, o nome Bedlam, Hospital Psiquiátrico, permanecerá sempre associado à crueldade, ao tratamento desumano e ao terror. Você já conhecia essa história sombria? Compartilhe sua opinião conosco! E se você se interessa por relatos perturbadores e pouco conhecidos, não deixe de explorar também os horrores dos orfanatos.

Esta fotografia em preto e branco mostra o exterior do Bethlem Royal Hospital, em Londres, em 1926, quando se mudou para St George’s Fields, em Southwark, que hoje é o local do Museu Imperial da Guerra.

Fonte: 1 2

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Movido por uma curiosidade insaciável, ansiava por um espaço onde pudesse preservar as curiosidades singulares que encontrava em livros e na internet. Dessa busca, surgiu o Magnus Mundi em 2015. Julio Cesar, nascido em Blumenau e residindo em Porto Belo, litoral de Santa Catarina, viu seu desejo de compartilhar maravilhas peculiares tomar forma nesse site.

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