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A Catedral: a prisão pessoal de Pablo Escobar

Em 1991, a vida de Pablo Escobar foi marcada por uma trajetória notável, que começou modestamente como ladrão de carros e evoluiu para se tornar um pequeno traficante e sequestrador, alcançando posteriormente o título infame de “o rei da cocaína”. Contudo, essa transformação veio acompanhada de um custo extremamente elevado. Ao longo de uma década, Escobar acumulou inúmeros inimigos, incluindo cartéis de drogas rivais e governos de diversos países, que se uniram para desmantelar sua vida e seu império.

A rivalidade intensa com o Cartel de Cali resultou em mais de 300 mortes entre seus associados e familiares, deixando um rastro de violência e destruição. Além disso, Escobar testemunhou a extradição de colegas traficantes, como Carlos Lehder, para os Estados Unidos, e outros, como os irmãos Ochoa, optando por se entregar e enfrentar a prisão. Gonzalo Rodriguez Gacha, outro traficante colombiano, e seu filho encontraram seu fim em confrontos violentos com a polícia.

A Catedral: a prisão pessoal de Pablo Escobar
Pablo Escobar

Entretanto, o ponto crítico foi alcançado quando sua filha Manuela foi ferida em um atentado a bomba em sua própria residência, abalando profundamente a família de Escobar e deixando-o mais vulnerável do que nunca. É inegável que a jornada de Pablo Escobar foi repleta de desafios, mas também marcada por um legado de destruição e sofrimento. Sua ascensão meteórica no mundo do crime acabou por lhe custar muito mais do que poderia imaginar.

Em um momento crucial de sua vida, Pablo Escobar se viu diante de uma difícil decisão: render-se ao governo colombiano, mas com o temor de ser extraditado para os Estados Unidos, o que era sua maior apreensão. Ele costumava dizer que preferia encontrar seu túmulo na Colômbia a enfrentar uma cela nos Estados Unidos.

A Catedral: a prisão pessoal de Pablo Escobar
Um gigantesco mural com uma foto de Escobar atrás das grades, acompanhado da frase “Aqueles que não conhecem sua história estão condenados a repeti-la

Buscando uma solução negociada, Escobar entrou em diálogo com o governo e, após seis meses de negociações secretas, chegou a um acordo para se entregar e enfrentar a prisão. No entanto, ele estabeleceu condições muito peculiares para essa prisão. A instalação prisional seria construída de acordo com suas próprias especificações e em um local de sua escolha. Além disso, teria seus próprios guardas pessoais, cuja principal responsabilidade não seria apenas evitar sua fuga, mas também protegê-lo de seus inimigos.

Esse acordo também incluía a remoção do general Miguel Maza, um dos maiores rivais de Escobar, bem como uma solicitação para que a Polícia Nacional da Colômbia não tivesse permissão para entrar em um raio de 20 quilômetros ao redor da prisão. Em troca dessas concessões por parte do governo, o compromisso era não extraditar Escobar para os Estados Unidos.

A Catedral: a prisão pessoal de Pablo Escobar
Imagem de satélite daCatedral

Essa “falsa prisão” de Escobar, embora embaraçosa para o país, foi considerada uma forma de aliviar o governo de um grande problema nacional. Em meio a essa complexa situação, o acordo permitia que o governo lidasse com a questão de forma aparentemente satisfatória, enquanto proporcionava a Escobar certas garantias para sua segurança pessoal.

No entanto, essa abordagem única para a prisão acabou gerando controvérsias e críticas tanto dentro quanto fora da Colômbia, visto que concedia tratamento especial a um criminoso notório como Escobar. A história dessa negociação complexa e suas implicações certamente fazem parte do legado tumultuado de Pablo Escobar na história da Colômbia.

Antes de formalmente se render, Escobar iniciou a construção de sua prisão nas colinas que se debruçavam sobre a cidade de Medellín. Essa localização elevada proporcionou a ele uma visão panorâmica da cidade que ele praticamente governou por mais de quinze anos. A paisagem montanhosa também era especialmente vantajosa, pois tornava extremamente difícil para as forças militares ou cartéis rivais montarem um ataque aéreo ao complexo.

A Catedral: a prisão pessoal de Pablo Escobar

A escolha estratégica de construir a prisão nas colinas não só permitia a Escobar monitorar suas antigas operações e territórios, mas também proporcionava uma proteção adicional contra possíveis invasões inimigas. A topografia íngreme e o terreno acidentado serviam como uma barreira natural, dificultando qualquer tentativa de acesso não autorizado ao seu refúgio fortificado.

Essa decisão de construir sua própria prisão, sob suas próprias condições, mostrou a habilidade de Escobar em utilizar sua influência e recursos para garantir uma espécie de confinamento personalizado, protegido de ameaças externas. Essa construção peculiar simbolizou o poder e a audácia do traficante, evidenciando a extensão de sua influência sobre a região e sua determinação em controlar sua situação, mesmo quando se entregava às autoridades.

A Catedral: a prisão pessoal de Pablo Escobar

Em 19 de junho de 1991, Pablo Escobar finalmente se rendeu às autoridades colombianas. No mesmo dia, ele foi transferido de helicóptero para sua recém-construída “prisão”, que ganhou o apelido de “La Catedral” (ou A Catedral) devido à sua grandiosidade e às comodidades luxuosas que oferecia. De fato, o local era tão surpreendente que alguns o chamavam de “Club Medellin” ou “Hotel Escobar”, localizado no município de Envigado, departamento de Antioquia.

A atmosfera dentro da prisão era notavelmente diferente das prisões tradicionais. Os próprios guardas faziam piadas de que não se tratava de uma prisão de segurança máxima, mas sim de conforto máximo. Essa brincadeira refletia a realidade do ambiente em que Escobar estava, onde ele desfrutava de um nível incomum de liberdade e privilégios.

A Catedral: a prisão pessoal de Pablo Escobar

A “prisão” de Escobar, em vez de ser um lugar de privação e punição, se assemelhava mais a uma espécie de retiro extravagante, onde ele continuava a exercer considerável controle sobre suas atividades e interações. Esse cenário peculiar e o tratamento especial que ele recebia geraram controvérsias e críticas, pois parecia que o criminoso estava sendo recompensado em vez de responsabilizado por seus atos.

O complexo de “La Catedral” era verdadeiramente impressionante em suas instalações e comodidades. O local abrigava diversas edificações, incluindo uma casa de blocos de concreto para o diretor da “prisão”, sete torres de guarda e um grande prédio no topo da encosta destinado ao próprio prisioneiro, Pablo Escobar.

A Catedral: a prisão pessoal de Pablo Escobar

Dentro de sua suíte, Escobar desfrutava de um estilo de vida luxuoso e opulento. Sua suíte contava com uma cama giratória, um banheiro equipado com jacuzzi, além de uma discoteca, um bar, uma academia, uma sala de bilhar e até mesmo uma casinha de bonecas para sua filha brincar durante as visitas. Essas instalações mostram o alto grau de conforto que ele se permitiu, apesar de estar formalmente detido.

Escobar também manteve acesso a tecnologia moderna dentro da “prisão”. Ele tinha telefones celulares, transmissores de rádio e um aparelho de fax que lhe permitia continuar conduzindo negócios mesmo estando preso. Durante o auge de suas atividades, o cartel sob seu comando chegou a render cerca de US$ 60 milhões por dia e controlava até 80% do tráfico de cocaína para os Estados Unidos.

A Catedral: a prisão pessoal de Pablo Escobar

Uma das peculiaridades mais notáveis ​​da “prisão” era o poderoso telescópio que Escobar havia instalado. Com esse dispositivo, ele conseguia observar a cidade de Medellín, incluindo o prédio onde sua família residia. Essa medida mostrava a extensão da obsessão de Escobar em manter o controle sobre seus negócios, mesmo estando aparentemente recluso. Para garantir a segurança do complexo, este era cercado por uma cerca de três metros de altura, equipada com arame farpado eletrificado, reforçando ainda mais a sensação de isolamento e proteção.

A existência de “La Catedral” e as condições que Escobar desfrutou dentro dela continuam sendo um ponto de discussão sobre as falhas do sistema de justiça e a extensão da influência do criminoso sobre as autoridades colombianas. Essa “prisão” de luxo é um reflexo do poder e da audácia do traficante, ressaltando a complexidade de sua figura na história do narcotráfico.

A descrição da prisão de Pablo Escobar em “La Catedral” revela a extensão do tratamento especial que ele recebia enquanto estava detido. Durante seu período na prisão, ele recebia visitas de uma variedade de pessoas, incluindo amigos, parceiros de negócios, políticos, rainhas da beleza e prostitutas. Essas visitas eram frequentes e proporcionavam um ambiente festivo e social na prisão. O traficante celebrava ocasiões especiais, como seu aniversário, com luxuosos banquetes preparados por alguns dos melhores chefs de Medellín. A prisão de Escobar também se tornou cenário para eventos incomuns, como a realização de um casamento no local. Essas celebrações e eventos mostram a influência que ele ainda detinha, mesmo atrás das grades.

Outra atividade incomum era o convite de jogadores de futebol para partidas dentro da prisão. Em uma ocasião, antes das eliminatórias para a Copa do Mundo de 1994, todos os vinte e dois jogadores da Seleção Colombiana visitaram “La Catedral” e participaram de um amistoso com um famoso clube de futebol. Durante essas partidas, os guardas prisionais atuavam de forma diferente, servindo bebidas e agindo como garçons no bar, em vez de exercerem suas funções de segurança.

Essa atmosfera extravagante e festiva na prisão é um reflexo da vida confortável que Escobar levava, o que reforça a percepção de que ele não estava cumprindo sua sentença de maneira adequada. Essas revelações levantam questionamentos sobre o sistema penitenciário colombiano e a corrupção que permitiu que Escobar desfrutasse de tantos privilégios durante seu período de detenção. Sua “prisão de luxo” se tornou um símbolo das complexidades e falhas do combate ao narcotráfico na Colômbia.

O relato da prisão de Pablo Escobar em “La Catedral” revela o quão pouco restringido ele estava em suas ações, chegando ao ponto de ordenar a tortura e morte de seus próprios tenentes em uma disputa de dinheiro. Essa atitude extrema finalmente acendeu o alerta vermelho para o governo colombiano, que percebeu que as coisas tinham ido longe demais e que Escobar precisava ser transferido para uma prisão adequada, onde não teria mais tanto controle e liberdade.

Em 22 de julho de 1992, um ano e um mês após Escobar se estabelecer em sua “prisão”, o vice-ministro da Justiça, Eduardo Mendoza, foi ao encontro de Escobar para comunicar a decisão do governo. No entanto, a notícia não foi bem recebida pelo chefe do cartel, que reagiu com fúria e até mesmo ameaçou matar Mendoza.

Diante da situação tensa e ameaçadora, as autoridades agiram rapidamente e o Exército Nacional da Colômbia cercou a prisão. Um tiroteio irrompeu entre o exército e os guardas de Escobar durante a confusão. Aproveitando-se do caos, Escobar conseguiu escapar usando uma rota de fuga que havia sido construída na instalação durante a sua construção, reforçando a ideia de que ele tinha um alto grau de controle sobre o local e as circunstâncias.

Essa fuga espetacular de “La Catedral” trouxe ainda mais controvérsias e críticas ao sistema de justiça colombiano e à eficácia de suas instituições. A saga de Escobar e sua habilidade em escapar das garras da lei continuaram a destacar as falhas do combate ao tráfico de drogas e o poder corruptor de figuras criminosas influentes como ele. Sua fuga marcou outro capítulo tumultuado na história do narcotráfico e do cartel de Medellín.

Após a fuga espetacular de “La Catedral”, o governo colombiano lançou uma intensa caçada por Pablo Escobar. Apesar de milhares de soldados e policiais vasculharem as ruas de Medellín, ele conseguiu se manter foragido por dezessete meses, desafiando todas as tentativas de capturá-lo. Entretanto, essa caçada incansável chegou ao fim em 2 de dezembro de 1993, quando as autoridades finalmente conseguiram prendê-lo. O traficante foi morto a tiros durante uma tentativa de fuga, marcando o fim de uma era de violência e influência de um dos criminosos mais poderosos do mundo.

Após a prisão de Escobar, “La Catedral” ficou abandonada e vazia por muitos anos. Caçadores de sucata vasculharam o local em busca de itens valiosos, como banheiras, canos, telhas e materiais de telhado. A estrutura majestosa que um dia abrigou o traficante estava agora sendo desmantelada e saqueada.

Durante seu período em “La Catedral”, Escobar contrabandeou dinheiro para a prisão em latas de leite. Essa informação levou a rumores de que ainda poderia haver latas enterradas no complexo contendo milhões de dólares. Esses boatos atraíram caçadores de tesouros, que reviraram o local na esperança de encontrar resquícios da fortuna do traficante. No entanto, segundo informações, nada significativo foi encontrado.

A história de “La Catedral” e o fim trágico de Pablo Escobar continuaram a ser um marco significativo na história do narcotráfico e das lutas contra o crime organizado na Colômbia. O legado de Escobar como um dos traficantes de drogas mais infames da história ainda ecoa até hoje, assim como os efeitos de sua influência e violência na sociedade colombiana.

É notável como a história da propriedade de “La Catedral”, que já abrigou o notório traficante Pablo Escobar, passou por uma transformação significativa ao longo dos anos. Em 2007, o governo colombiano tomou uma decisão importante ao emprestar a área de 28.000 metros quadrados para uma fraternidade de monges beneditinos herméticos. Essa comunidade transformou o local em um “centro de turismo religioso e cultural”, que hoje abriga uma série de instalações e serviços em benefício da comunidade.

A propriedade agora possui uma capela, uma biblioteca e uma cafeteria, criando um ambiente acolhedor para peregrinos religiosos e visitantes em busca de reflexão espiritual. Além disso, a área inclui uma casa de hóspedes destinada a receber peregrinos religiosos, oficinas culturais e uma trilha ecológica para conectar os visitantes com a natureza ao redor.

Destaca-se também a existência de um memorial dedicado às vítimas do cartel de drogas, provavelmente honrando aqueles que sofreram nas mãos de Escobar e de sua organização criminosa. Essa iniciativa é uma forma de manter viva a memória das consequências nefastas do tráfico de drogas e do poder desmedido do cartel de Medellín.

Hermilda de Escobar (segunda da direita), mãe do chefão do cartel de drogas de Medellín, Pablo Escobar (retrato), caminha com amigos e parentes até o túmulo de Escobar para comemorar o primeiro aniversário de sua morte. 
Escobar foi morto por forças especiais colombianas depois de ser descoberto escondido em uma casa em Medellín. 
(Guillermo Tapia/AFP/Getty Images)

Um aspecto interessante é a inclusão de um refúgio para idosos que não podem pagar por instituições de cuidados de longo prazo na cidade. Essa instalação demonstra um compromisso com a comunidade local, oferecendo apoio e cuidados a idosos que de outra forma poderiam enfrentar desafios no acesso a serviços de saúde e assistência adequados.

A presença de um gigantesco mural com uma foto de Escobar atrás das grades, acompanhado da frase “Aqueles que não conhecem sua história estão condenados a repeti-la“, é um lembrete impactante sobre o passado sombrio e a importância de aprender com os erros cometidos na história da Colômbia. Essa frase convida os visitantes a refletir sobre as consequências trágicas do narcotráfico e sobre a necessidade de evitar que tais acontecimentos se repitam no futuro.

Essa transformação da antiga prisão de Escobar em um centro religioso, cultural e de apoio comunitário é um exemplo significativo de como é possível reverter a história de um local infame para fins positivos, buscando honrar as vítimas e construir uma comunidade mais forte e unida.

Vídeo gravado por um jornalista mostra o complexo logo após sua fuga

Fontes: 1 2

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